O Partido, os Estudantes e a Praça #94
No fim da década de 1980, os estudantes universitários de Pequim, na China, foram responsáveis por liderar o maior protesto da história da cidade.
Apenas no ano de 1988, mais de 210 protestos estudantis ocorreram por toda a China.
Eles reivindicavam maiores investimentos na educação, exigindo o fim da alta inflação e da corrupção, tanto na área pública quanto privada.
Os estudantes de Pequim estavam inseridos em um ambiente acadêmico que propiciava o surgimento de manifestações: a maioria das 67 universidades de Pequim estavam próximas umas das outras.
Essa proximidade facilitava a difusão de ideias, concebidas nos dormitórios estudantis e divulgadas nas ruas de Pequim.
As principais mobilizações ocorriam em uma icônica praça no centro da cidade: a Praça Tiananmen, a Praça da Paz Celestial.
A maioria dos estudantes de Pequim dividiam-se entre a ala da esquerda, críticos ao regime de Mao e outros mais à direita, inspirados por pensadores liberais dos EUA.
Embora fossem separados por diferentes princípios, os estudantes eram unidos devido às suas ideias não-conformistas, pois ambos estavam insatisfeitos com o rumo do governo na última década, encabeçado por Deng Xiaoping.
Após sucessivos protestos iniciados por estudantes liberais em 1985, 1987 e 1988, em 1989 o movimento cresceu e foi apoderado por vários setores da sociedade chinesa.
Ao longo dos meses de abril e maio de 1989, mais de 1 milhão de pessoas protestaram na Praça Tiananmen : não apenas estudantes, mas operários, políticos, policiais e até membros do exército chinês.
Muitos integrantes do Partido Comunista Chinês, abriram o diálogo com os estudantes, apoiaram o movimento e até o financiaram.
Por exemplo, o Ministério da Cultura da China foi responsável por doar 360 yuans aos estudantes; um vice-comandante de divisão do Exército de Libertação Popular da China, doou mil; o presidente do Partido da Democracia Progressiva da China, Lei Jieqiong, doou outros mil yuans.
Organizações trabalhistas também entraram no movimento: os Trabalhadores da Companhia Têxtil Geral de Pequim doaram dez mil.
Enquanto isso, a Federação Chinesa de Sindicatos e o Comitê de Angariação de Fundos da Loteria de Bem-Estar Social da China doaram 100.000 yuans cada.
Em 1989, foi registrado que quase 60% da população chinesa apoiava o direito dos estudantes de protestar, com apenas 10% se opondo e 30% sem opinião concreta sobre o movimento.
Em determinado momento, os protestos não estavam mais em Pequim: tinham se espalhado por toda a China: em 19 de maio, daquele ano, mais de 400 cidades chinesas estavam envolvidas com os protestos de uma forma ou outra.
O Secretário Geral do Partido Comunista, Zhao Ziyang anunciou que os protestos eram legítimos e as demandas dos estudantes deveriam ser levadas em consideração.
Entretanto, a ala conservadora do Partido Comunista Chinês pensava diferente.
Liderados por Deng Xiaoping, que tinha iniciado suas reformas de liberação econômica, o movimento foi rotulado como burguês e contrarrevolucionário, encabeçado por alguns estudantes liberais.
De fato, o movimento foi iniciado pelos liberais, mas mais tarde, foi adotado e reconduzido por muitos estudantes de esquerda, que iniciaram uma greve de fome na praça.
Entretanto, aquelas semanas de demonstração popular terminaria de forma bastante diferente do que muitos estudantes imaginavam.
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Dicas Culturais (8)
1: Romance Forbidden City, de William Bell, uma versão fictícia dos protestos
2: O livro “Prisoner of the State: The Secret Journal of Premier Zhao Ziyang” foi publicado em maio de 2009 depois que fitas com entrevistas de Zhao Ziyang foram contrabandeados para fora da China.
3: The Gate of Heavenly Peace é um documentário de 1995, altamente recomendável, produzido por Richard Gordon e Carma Hinton, feito ainda alí, no calor do momento, pouco tempo depois dos protestos.
4: Tiananmen: The People Versus the Party, uma mini série documental da PBS de 2019 em 2 episódios.
5: Moving the Mountain, de 1994, é um documentário de 1994 dirigido por Michael Apted e produzido por Trudie Style. O filme leva o título das memórias de Li Lu, um dos líderes estudantis dos protestos na Praça da Paz Celestial de 1989.
6: Tem um ótimo documentário da BBC chamado “Kate Adie returns to Tiananmen”, no qual a repórter Kate Adie retorna à China e relembra os eventos que testemunhou em 1989.
7: Recomendo também uma palestra do TED talks, “Lessons from a Tiananmen Massacre Survivor”, ministrada pelo Jianli Yang.
8: Quadrinho “Tiananmen 1989: Our Shattered Hopes” By LUN ZHANG and ADRIEN GOMBEAUD, Illustrated by AMEZIANE.
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Fontes (16)
1: O Poder de Tiananmen: Relações da sociedade-estado e o movimento estudantil de Pequim, Dingxin Zhao: https://press.uchicago.edu/ucp/books/book/chicago/P/bo3641295.html
2: The Party: The Secret World of China’s Communist Rulers, de Richard McGregor
3: Tiananmen Square : The Making of a Protest, de Vijay Gokhale
4: . The Tiananmen Square Protests of 1989, Hay, Jeff
5: Tiananmen exiles: Voices of the struggle for Democracy in China.” He, Rowena Xiaoqing. “(2014).
6: The people’s republic of amnesia: Tiananmen revisited, Lim, Louisa. Oxford University Press, USA, 2014.
7: Wasserstrom, Jeffrey Ν. “History, Myth, and the Tales of Tiananmen.”
8: Popular protest and political culture in modern China. Routledge, 2018
9: Cronologia dos Eventos:
https://www.jstor.org/stable/20672217
Vídeos:
11: Homem vs. tanque chinês Praça Tiananmen – 5 de junho de 1989
https://www.youtube.com/watch?v=YeFzeNAHEhU
12: Sobrevivente da Praça da Paz Celestial reflete 30 anos depois
https://www.youtube.com/watch?v=PE_1VGdDI5Q
13: ‘Ainda estou com raiva’, um sobrevivente de Tiananmen confronta memórias dolorosas | WSJ
https://www.youtube.com/watch?v=mXqLLWl8X34
14: Arquivo: Tropas chinesas disparam contra manifestantes na Praça da Paz Celestial – BBC News
https://www.youtube.com/watch?v=kMKvxJ-Js3A
15: Massacre de Tiananmen: A perspectiva de um soldado
https://www.youtube.com/watch?v=WEdme5wT1Fs
16: The Tank Man (full film) | FRONTLINE